Dúvida

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Parecia que as palpitações lhe soavam a pancadas abafadas na madeira da porta. Um ruído cego, que o fez contorcer-se até se mirrar de pânico.
Era sempre quando a madrugada começava a acordar que alguém lhe batia à porta, real ou imaginariamente. Um eco cheio de força que o reduzia ao ínfimo do quarto. Sentava-se na cama, sem acender a luz, espreitava pela janela sempre aberta. Esperava a claridade, ansiava que a luz o despertasse com um beliscar firme no braço. Mas da janela sempre aberta apenas vislumbrava uns pontinhos distantes a esmaecer. Sentado esperava. Sentado tremia, enquanto as mãos tacteavam em busca do maço e do isqueiro. Quedava-se sempre nesse instante, em que a faísca o poderia tanto salvar como derrotar. Entre a luz da chama e o ruído da denúncia, nunca se decidia.
Mais uma pancada, agora parecia vir das entranhas da parede fria. Todo o corpo latejava, a cada gesto na espera, maldizia a escuridão.
Ia falando, de si para si, de si para todos os que um dia o ouviram. Desfiava nomes que o tempo não esborratou. E feitos e gestos e memórias. De cada pessoa, ia folheando as imagens, o toque, o sorriso, a expressão. E assim se entretinha enquanto a noite se despedia.

- Mas tu nunca dormes?
- Não sei ...
Vim da rua de matar alguém
E foi assim que eu matei por bem
As razões? Não há razões
É que eu não tenho mais amor para dar
e a ninguém


Teimosia

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Ele disse "vamos ficar aqui", repetiu e treinou demoradamente frente ao reflexo nocturno. Preparou quase milimetricamente o momento da partida, poisou o bilhete que tinha desenhado enquanto contava as horas.
Mirou a foto na cabeceira. Não encontrou o seu rosto, ainda que o tenha reconhecido através do pálido luar fosco. E apercebeu-se que era a segunda noite sem dormir.
Ele disse, repetiu, e esmoreceu. O relógio palpitava horas e arrotava segundos trémulos. O bilhete amareleceu. E a luz encostou-o à parede.
Houve uma manhã sucessiva em que quis acreditar que o céu é feito para ser um limite tangível. Houve uma tarde em que soube que a terra o comeria vorazmente. Mas não houve uma noite que tivesse fim ou que morresse às bocas do desespero. De noite, o único medo era a luz, porque as palavras, essam, eram dóceis.
Os gestos, esses, ficaram guardados e escondidos no fundo do dia, em que as peças de carvão que são as pessoas, acordam para um nada onde julgam existir.




Amigos são sobras do tempo
Que enrolam seu tempo à espera de ver
O que não existe acontecer


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