Queda

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Acordou sufocado em si mesmo, e escondeu-se debaixo do lençol. Meio a medo, ou todo a medo, ergueu a cabeça para confirmar que ninguém dera por ele.
Doía-lhe a cabeça da insónia durante o sono, do sono durante a noite, os olhos rebentavam de tanto latejar.

Percebeu que afinal ainda dormia, acordado. Não viu o sol da manhã, apenas sentiu o frio da neve inesperada que o rodeou subitamente. Apenas branco nu à sua volta, e a voz presa no fundo da garganta arranhada. Não viu antes, não via agora, que o gelo lhe queimava os olhos, se os olhos quisessem ver para fora do corpo.

Era como nos filmes, nos documentários, nos pesadelos. Apenas o branco rugoso da neve verdadeira se estendia por onde a vista poderia alcançar. Sentiu que todo o planeta gelada, toda a vida morrera, e apenas restava ele, moribundo. Com o corpo dormente, já a dor não o alcançava. Procurou as mãos, sempre as mãos, apertou-se uma contra a outra, abraçou-se, mas não se sentiu mais vivo por isso.
Então soube. Sempre soubera.

Primeiro um fio, ténue e quase vivo, escorreu de si. Fechou os olhos e deitou-se, enquanto as golfadas se tornavam mais puras e mais fortes. Deixou-se ir, enfraquecendo enquanto esboçava um sorriso de paz. Tentou sonhar, mas lembrou-se que este era o seu pesadelo tornado real.

Finalmente, morreu. À sua volta, a neve tornara-se vermelha. Foi quando começaram a chegar os mudos.



Estranha forma de acordar
Que é estar pronto para dormir


Colo

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Veio a noite, e depois a manhã. Era o primeiro dia. De muitos outros que o antecederam.
Mordeu o lábio na incerteza de uma história começada e passada na total escuridão. Viu o filme na sua cabeça, de dois náufragos lutando veementemente para alcançar a luz de uma terra que se quis sagrada e foi afinal envenenada.

Tocou à campainha, uma e outra vez. A porta verde não se abria, e tudo ali lhe parecia um sinal de desistência, de baixar braços, de desistir de nadar. Mas esperou um pouco mais, olhando as suas mãos. Tantos abraços que já tinham dado, e esboçou um quase sorriso.

Sentou, voou, gritou, esperneou, deitou a língua de fora. Recortou tiras de papel e distribuiu. Afixou desenhos, recebeu desenhos. Colheu sorrisos e beijos. E ovos da Páscoa. Voou para longe da solidão.

Veio a tarde. A despedida. O fim do primeiro dia. E mesmo no fim, um grito ecoou, mamã, mamã. Um sorriso aberto, um riso estonteante, um calor no centro do corpo e uma felicidade indizível. Abriu a porta verde. Pegou-lhe ao colo, mas sentiu-se levada ao colo.

quando penso no futuro
o denso fica mais denso
e prefiro
prefiro deixar de pensar
e nadar para outro lado do mar


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