E se só tivermos o agora? Perguntas-me, triste, e eu carrego a tua tristeza sem to dizer.
Meu amor, sabe que só temos o agora, é tudo o que temos. E é como uma bola de sabao, efemera e mágica, finíssima e encantada. Nada mais. E se nao for para ser agora, entao teremos apenas o nada do agora que já tivemos.
E eu reconhecer-te-ei. Em cada esvoacar de ave de asa em V, em cada ínfimo pormenor colorido, em cada gesto preso, em cada som rodopiado, em cada ritmo descompassado, eu reconhecer-te-ei. Em cada riso desfeito, em cada olhar invisível, em cada cheiro que se impregnar em mim, reconhecer-te-ei. E serás em mim, mesmo que o nao saibas, um agora cheio de memórias.
E tu reconhecer-me-ás, o meu olhar manso, a minha interrogacao receosa, o meu ardor contido, o meu perfume em ti, o meu sorriso para ti, o meu medo por nós e o meu devir.
E quando, fendido e quente, te debrucares sobre outro corpo, quando solucares, rouco, num esquecimento que te tolde os sentidos, e a alma, dentro de uma mulher que nao eu, aí, e só aí, saberas que me esqueceste. E que o agora que temias, feito bola de sabao, implodiu.
Como o amor.
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