Entrelaçou os nós dos dedos na ânsia de se lhe esvair o sangue do peito. A cidade arrotava movimento e os passos ecoavam na cabeça como se nada mais houvesse num tempo parado.
Pegou na mochila e sentou-se na cancela preta e amarela onde os dias se tornam quentes e os passos cansados descansam. Era de tarde, como de tarde se sente a vontade de voltar para casa. O céu rasgou-lhe o ar enquanto se despedia da luz, e os faróis dos carros brindavam-se mutuamente num eco trémulo. Perpétuo movimento, pensou, enquanto se permitiu sorrir... como teria apreciado uma fotografia daquele perpétuo movimento.
E quando o sorriso ganhou força, os olhos quiseram fechar-se para não ver. As mãos dadas. Fugidias, contentes e cúmplices. As mãos dadas, as mãos dadas e nenhuma era a sua. O sorriso morreu ali. Nem uma palavra, nem um aceno, nem um cumprimento, o nada de parte a parte. Apenas o vazio. E um sentimento de dormência esfarrapada e condoída. A história nunca acaba, e quem disse que nunca se repete?
não disse nada
porque nada havia para dizer
amordacei as horas por preencher
não disse nada
porque nada havia para dizer
eventualmente o peito deixa de doer
"A cidade arrotava movimento e os passos ecoavam na cabeça como se nada mais houvesse num tempo parado"
"O céu rasgou-lhe o ar enquanto se despedia da luz, e os faróis dos carros brindavam-se mutuamente num eco trémulo. Perpétuo movimento, pensou, enquanto se permitiu sorrir... como teria apreciado uma fotografia daquele perpétuo movimento."
muito bom! muito bom!