Espreitou, uma e outra vez, a confirmar quantos segundos teriam passado desde a última vez que olhara para os números malditos.
Contou os dias, pegou numa folha de papel quadriculado, as mãos quase lhe tremiam enquanto alisava a folha contra o tampo da mesa. De lápis e borracha, volveu à aritmética. Dias que se fizeram horas e horas multiplicadas em minutos e segundos que brotavam no carvão.

Era esse o tempo, pareceu-lhe uma vida imensa, inteira. O ar fugiu-lhe, escapou-se para a ampulheta invisível desenhada no papel, construída de arestas de números e traços e sinais. Escoou a saudade para dentro da ampulheta, verteu-a como se de ouro líquido se tratasse. A saudade é um bem precioso, repetia, enquanto as mãos denunciavam a incerteza.
Turvou a visão, e parecia que o chão estava no tecto, flutuava trespassado pelas setas que os números formavam agora. A lei da gravidade era inexistente. Olhou em volta, e o fosco da paisagem aguçou-lhe a perspectiva.
Estava dentro do vidro da ampulheta. Escorria ...
andamos em voltas rectas
na mesma esfera
onde ao menos
nos vemos